quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

O banqueiro anarquista


« - O mal verdadeiro, o único mal, são as convenções e as ficções sociais, que se sobrepõem às realidades naturais - tudo, desde a família ao dinheiro, desde a religião ao estado. A gente nasce homem ou mulher - quero dizer, nasce para ser, em adulto, homem ou mulher; não nasce, em boa justiça natural, nem para ser marido, nem para ser rico ou pobre, como também não nasce para ser católico ou protestante, ou português ou inglês. É todas estas coisas em virtudes das ficções sociais. Ora essas ficções sociais são más porquê? Porque são ficções, porque não são naturais. Tão mau é o dinheiro como o estado, a constituição da família como as religiões. Se houvesse outras, que não fossem estas, seriam igualmente más, porque também seriam ficções, porque também se sobreporiam e estorvariam as realidades naturais. Ora qualquer sistema que não seja o puro sistema anarquista, que quer a abolição de todas as ficções e de cada uma delas completamente, é uma ficção também. »

« Ora, de duas coisas, uma: ou o natural é realizável socialmente ou não é: em outras palavras, ou a sociedade pode ser natural, ou a sociedade é essencialmente ficção e não pode ser natural de maneira nenhuma. »

« Pois bem: uma vez assente este critério, nunca mais deixei de o ter presente...Ora, na altura da nossa propaganda em que lhe estou falando, descobri uma coisa. No grupo de propaganda - não éramos muitos: éramos uns quarenta, salvo erro - dava-se este caso: criava-se tirania.
- Criava-se tirania?... Criava-se tirania como?
- Da seguinte maneira... Uns mandavam em outros e levavam-nos para onde queriam; uns impunham-se a outros e obrigavam-nos a ser o que eles queriam: uns arrastavam outros por manhas e por artes para onde eles queriam. »

« - Veja bem o que isso representa... Um grupo pequeno de gente sincera (garanto-lhe que era sincera!), estabelecido e unido expressamente para trabalhar pela sua causa da liberdade, tinha, no fim de uns meses, conseguido só uma coisa de positivo e concreto - a criação entre si de tirania. »

« Conclusão: esta nossa tirania, se não era derivada das ficções sociais, também não era derivada das qualidades naturais; era derivada de uma aplicação errada, duma perversão, das qualidades naturais. E essa perversão, de onde provinha?
Tinha que provir de uma de duas coisas: ou de o homem ser naturalmente mau, e portanto todas as qualidades naturais serem naturalmente pervertidas; ou de uma perversão resultante da longa permanência da humanidade numa atmosfera de ficções sociais, todas elas criadoras de tirania, e tendente, portanto a tornar já instintivamente tirânico o uso mais natural das qualidades mais naturais.»

(...)

Fernando Pessoa, In revista Contemporânea, Maio de 1922

segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

A facilidade que tenho em gostar de muita coisa, tem-se vindo a tornar no meu maior problema.

Gostava por exemplo de adorar, mas adorar mesmo, a arte de cultivar. E quem diz cultivar diz outra coisa qualquer.

De momento o Rock'n'Roll fascina-me. A alegria que transmite e a energia que contém são incríveis, a força do bem está-me a puxar - Adeus poetas suicidas, adeus!


Até daqui a uma semana...